terça-feira, 3 de novembro de 2015

Antes de começar...

Para expor a princípio como serão expostas minhas ideias nesse blog, é importante deixar claro como algumas pequenas formas de pensamento pessoais são expostas, alguns paradigmas, algumas gírias internas e até mesmo alguns neologismos. E não poderia deixar de ser o meu primeiro post do blog explanar sobre a pequena Araújos. Cidade onde não nasci, mas morei por longos 9 anos, minha infância inteira. Momento crucial de minha vida, onde construí minha maneira de ver o mundo.
Araújos - MG
Foto: gylmarkc





Incrustada no centro-oeste mineiro, suas características, suas ideologias, seus paradigmas, a forma de pensar de seus moradores, a religião, seus valores; enfim,  tudo tem um peso enorme sobre minha forma de pensar atual. Vou citá-la bastante por aqui.
 
Araújos na década de 90
Foto:André Luciano
Por outro lado também, é a cidade que mais odeio. Tenho traumas, raivas, “agonias”, preconceitos, medos inexplicáveis e manias desagradáveis que adquiri nesse lugar. Independente de julgar se todas minhas características adquiridas nessa cidade sejam boas ou ruins, uma coisa é certa. Esta é de longe a cidade mais importante da minha vida. Me influenciou e me influencia profundamente, e tudo nesse mundo que ainda vou citar nesse blog vai fazer alguma relação à essa cidade. Todos os moldes de relação que estabeleço com alguma coisa nesse mundo tem relação com alguma coisa presente na realidade dessa cidade. Quando descobri o mundo, essa realidade era o que estava ao meu redor, e naquele momento, a pequena Araújos era o mundo pra mim.

Parte da Praça Central e a Igreja Matriz
Foto: Wilson Fortunato



Na década de 90, Araújos tinha uma pequena população que mal chegava aos 5000 e ainda conservava muito do clima interiorano mineiro típico. Morava numa enorme casa antiga bem no centro da cidade que pertencia a meu avô, casa que provavelmente já foi a maior e mais bela da cidade em seus tempos áureos. Cômodos enormes, desenhos delicados pintados na parede, portas e paredes grossos e largos, lustres, piso com detalhes multicoloridos e um quintal enorme. Não sei se era minha impressão pessoal na época (pois tudo que uma criança vê ao seu redor é maior do que para um adulto) mas essa era a maior casa que já havia entrado na época. E demorou muitos anos para que eu entrasse em uma maior. Só cozinha era umas 2x o tamanho da minha casa atual. Nos dias de chuva, não havia problema, eu andava de patins dentro de casa mesmo, dava pra fazer isso sem problemas e até demorava bastante patinar de uma ponta a outra da casa.

Araújos é vizinho da igualmente pacata “Perdigão”, que na época rivalizava com Araújos sobre qual seria a mais moderna cidade, algo que, pessoalmente, sempre foi bem equilibrado, pois na época, Araújos possuía um clube e Perdigão uma rodoviária. Fair enough!
Araújos está a aproximadamente 12,2km  de Perdigão. E apenas esse fato, pra mim,  é o suficiente para calcular o quão distante algum lugar é de outro. Via de regra a distância de minha casa ao Hotel que fiquei em Pequim, China, quando fui da última vez é igual a 1709,8 vezes de Araújos a Perdigão. A quantidade de quilômetros que subi a pé do último acampamento base até o topo do vulcão Erta Ale era de 2,4 vezes de Araújos a Perdigão. A distância de minha casa até o meu trabalho é de 0,3 vezes de Araújos a Perdigão.


Atualmente a cidade possui uma praça principal, algumas praças secundárias, um lago artificial, um clube de esportes, incontáveis bares, um coreto, uma pousada (a única opção de se hospedar por lá), uma quadra poliesportiva e algumas outras pequenas coisas nada de mais. Mas como uma cidade que claramente nunca foi particularmente encantadora poderia ter me marcado tanto?
Provavelmente o mesmo que me influencia em todos os lugares que visito ainda hoje por onde passo.  As pessoas!
Os valores das pessoas que viviam na cidade naquela época eram estritamente, digamos, tradicionais. O que hoje em dia ou poderia chamar por “machista”, “homofóbico”, “pés-no-chão”, “pragmático”, “religioso”, “não-lúdico”. (nada muito diferente do país inteiro, não é mesmo? Heheh)
O jovem Skald daquela época passou por muitas situações desagradáveis por ter ideias contrárias ao resto do rebanho. Artes, desenho, criatividade, expressividade, música sempre foi algo de segunda categoria por ali, e todos que não se dispunham a ser inexpressivo como os demais estariam sujeitos a serem taxados de “o diferente”; algo extremamente ruim de ser taxado em uma cidade tão pequena onde todos se conhecem.
Por outro lado, vejo coisas positivas em minha formação pessoal no meu crescimento na cidade, aprendi coisas quando criança que definitivamente não aprenderia se morasse em Belo Horizonte por toda vida; como andar de bicicleta, nadar, saber como selar um cavalo e a cavalgar, saber lidar com os animais, entender nomes de plantas e árvores, gírias e ditados populares que só existem na região (e fazem muito sentido), não ser fresco com comida e saber dormir com qualquer lugar, saber lidar com o bulling, saber bastante sobre a Bíblia e a religião católica, ser respeitoso com os demais, aprender a dividir as coisas, etc. E também, ao fato da cidade ser pacata e ter poucas opções de entretenimento, foi excelente para minha criatividade; o jogos sempre foram (e ainda é) minha paixão, foi nessa época que criei alguns jogos de cartas e de tabuleiro (onde sempre que posso ensino para alguém em viagens) , algumas adaptações de peças de teatro, onde aprimorou muito minha expressividade e minha acuidade na forma de lidar com as palavras.
A maneira como percebo as coisas hoje sofreu duras influências da cultura de Araújos, um mix do que sou hoje com o que a cidade era na época, vou citá-las bastante por aqui. Estou em constante mudança e cada vez mais tento evoluir ao passo de desconstruir alguns preconceitos ou receios inerentes aos habitantes típicos da cidade na década de 90, aos poucos a gente consegue.



Atualmente,  com a globalização e desenvolvimento das cidades, Araújos perdeu muito de suas características originais.  As pessoas não puxam mais o “r”, não plantam mais hortas como antigamente, nadar em rio agora é perigoso e nojento, crianças brincando na rua se torna algo mais raro, andar a cavalo pelas ruas é brega (a menos que vc esteja na cavalgada oficial da cidade), a “festa de Reinado” tradicional da cidade virou um segundo Carnaval, os homens não usam mais chapéus, as antigas ruas de pedra foram substituídas pelo asfalto, os católicos não são mais de 99% da cidade, trabalhar como lavrador/pecuarista não é mais comum, morar na região rural é raríssimo e as fofocas... Bom, as fofocas continuam como sempre foram...

Lago Artificial
Foto: Chistyam de Lima

O Coreto
Foto: André Luciano

Matriz de São Sebastião de Araújos
Foto: Aender

3 comentários:

  1. Oi Leandro. Amei o texto sobre a pequena Araújos. Muito gostoso de ler. Parabéns pelo Blog. Grande abraço!!!!

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  2. Doce infância, doces lembranças! Nós, interioranos, apesar de tudo, tivemos INFÂNCIA.

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